quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Farol

- Tia, dá um trocado?
- (Ele me chamou de tia??? Mas a gente tem quase a mesma idade...) Não dou nem fudendo.
- Mas eu acabei de passar na facul!
- Se você pode pagar um pau e meio por mês, pode pagar a sua própria cerveja.
- É um pau e 700. E quem está pagando não sou eu, é meu pai.
- Então dá para ele tudo que você conseguir. Ele deve estar precisando dessa cerveja muito mais do que você.

Bode dessa época de trote.

terça-feira, 24 de julho de 2012

Almoço

Foi tragada pela rotina que, ao final da refeição, deixou sobrar apenas um relógio e uma caneta sem tinta guardada em algum bolso.

segunda-feira, 16 de julho de 2012

Expectativando

Tem dias em que eu me sinto correndo de costas, numa esteira ao contrário. Sem saber qual o sentido, nem para quê tanto esforço. Com a sensação de que no final eu vou acabar cansada e no mesmo lugar onde eu comecei. Com sorte até um pouco mais magra, mas é só.

quinta-feira, 5 de abril de 2012

Comfort

O conforto me incomoda. Me ameaça, me dá medo de que eu goste demais dele e que em pleno namoro ele me abandone, acostumada demais `as suas regalias. O conforto para mim é um perigo. Quer coisa mais ameaçadora do que uma soneca no sofá em pleno sábado `a tarde? Que absurdo, não pode. Vai quê alguma coisa. Não aceitar o conforto é como esperar uma guerra que não estoura, confundir a ameaça de uma bomba biológica com um inofensivo pum do vizinho no elevador. O conforto é um tapete felpudo que eu puxo de mim mesma sem aviso. É como andar descalça numa esteira, na ilusão de que eu estou em movimento. Puro delírio de uma cabecinha que confunde tranquilidade com morosidade, vontade de descansar com preguiça. Um dia eu aprendo. Um dia, quando eu crescer, quero me dar uma caixa de conforto de presente, sem me sentir na obrigação de devolvê-la.

segunda-feira, 19 de março de 2012

Desconversa

- Alô?
- Oi.
- Tudo bem?
- Tudo, por que?
- Não, só para saber...
- O que exatamente você quer saber?
- Nada.
- Como nada?
- Do que você tá falando?
- Não sei, quem começou a falar foi você.
- Eu só disse alô.
- E eu disse oi.
- Pois é, não dava para dar um “oi tudo bem”?
- Mas foi você quem quis saber se estava tudo bem.
- Por que, não tá?
- Tá, por que?
- Não sei.
- Ah não sabe?
- Não e você?
- Não sei.
- Ah é?? Então tchau.
- Não, espera.
- Alô? Alô? Alô?

terça-feira, 6 de março de 2012

Começar, começando.

Escrever é tão solitário, que o simples fato de observar a vida alheia já me dá um certo alívio. Ok, tá tudo certo, fora dessa tela branca tem gente mergulhando em Fernando de Noronha, deitando na Paulista fazendo protesto, fotografando o próprio pé, na cama com os gatos. O problema é que esse alívio quase imediato, traz na sequência uma angústia danada. Porque mesmo com duas profissões, pouco tempo para escovar os dentes e ir ao banheiro, ainda caio na armadilha de achar que estou fazendo pouco. E tenho a impressão de que essa síndrome de Shiva, não acontece só comigo. Meu amigo dentista quer ser fotógrafo, o médico quer ser dj, o dj quer ser médico e se der tempo, nas horas vagas, campeão de esgrima. Parece ser o que somos já não basta mais. O que é maravilhoso por um lado, mas por outro, a provável causa da multiplicação das caixinhas de ansiolíticos. Fico pensando que se o Da Vinci vivesse na nossa época, estaria esculpindo, pintando, projetando, fazendo música, tudo igual. Mas ficaria pirado ao ver a página do Michelangelo ali, toda cheinha de novidade. Ou seja, de 500 anos para cá, o problema continua o mesmo, só que maior: a grama ( pelo menos no meu caso) dos 553 vizinhos. Por mais contraditório que isso possa parecer, olhar para os outros só deixa a gente ainda mais sozinhos. Então a solução é fechar a cortina, desligar o que não importa e continuar a fazer, fazendo.