sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Saudade

Faz dois anos que você foi. Não vou mentir, a dor passou, mas a saudade...essa não sei se vai ter jeito. Porque é assim, andando na rua, quando bate uma brisa, que ela aparece. E assim como o vento, eu não consigo controlar. Gela o peito e me faz lembrar como eu sinto saudades do seu olho que lacrimejava, de como você sempre esquecia o meu aniversário, mas me mandava cartas nem que estivesse no topo do Himalaia, como você já fez. Eu tenho muito medo de te esquecer, de não lembrar dos detalhes, de deixar a vida me atropelar e levar embora as minhas lembranças. E ao mesmo tempo, sem precisar pedir elas voltam, me tomam no meio do trabalho, como se você estivesse do meu lado se apoiando no meu ombro. Queria sonhar com você, saber para onde você foi. Em qual nuvem, em qual canto desse universo daria para gente se encontrar? Só por alguns instantes, pelo tempo de um abraço, nada mais. Eu juro.

terça-feira, 14 de junho de 2011

Ai pônei.

Na semana passada comprei uma máquina dessas daí. Como uma velha de 87 anos e sem a malemolência dos mais novos que manipulam essas invenções desde que nasceram, meus dedos duros começaram a explorar o tal bicho. Ca-rre-gan-do: eu lia em voz alta enquanto caminhava na rua e mexia na telinha recém engordurada. O que é aplicativo? Juro pra você que não sou nenhuma neanderthal, mas até ontem não sabia direito o que era isso e tinha vergonha de perguntar. Bem, descobri tudo muito mais rápido do que eu imaginava ( pra você ter uma idéia da revolução, meu celular antigo era aquele da Nokia que servia de lanterninha no cinema, lembra? Uma graça). Sim, esses tais aplicativos, botões facilitam e muito a nossa vida. É uma delícia para uma pirangueira como eu, trocar mensagens sem pagar, saber qual é o próximo filme do Reserva andando na paulista, etc, etc, etc. Mas tem uma coisinha que me incomoda. Calma, não vou discutir aqui o papel das redes sociais, da quantidade de informação que consumimos, blablablabla, pra isso já tem um monte de filósofos, pseudo filósofos, gente que faz duende de durepox que já mete o pau na tecnologia. Mas a verdade é que eu não sei muito bem me desligar. É como se sem essa checagem a toda hora, as oportunidades fossem escorregar pelos dedos das mãos. Neura pura, toc de controle, como aquela pessoa que confere a fechadura da porta ou o gás da cozinha 80 vezes antes de sair de casa. E nesse sentido, o I phone não me ajuda. Poder ter tudo na mão, me faz querer ter tudo. Simplificando, é como cartão de crédito, se tiver na bolsa, eu uso. Se estiver com I phone, consulto meu e-mail, o face, a conta do banco, o horóscopo da Susan Miller, mesmo que esteja no meio de um almoço delicioso com uma amiga que eu não vejo há muito tempo. Não me condene, eu sei que você que tem esse aparato já fez isso pelo menos uma vez na vida. Talvez seja fogo de palha, como toda relação que começa, a gente fica querendo se pegar (ui! brega). Só não tenho certeza se gosto de acordar de manhã e já saber entre a torrada e a torrada com manteiga o que tem na minha caixa de e-mails. Não quero ter que responder e-mails do trabalho, depois do trabalho. Não sei se quero estar ao alcance de todos, nem tenho certeza se quero tudo ao meu alcance. Te digo sinceramente, não sei. E a culpa não é dele. Eu é que não me controlo, eu é que sou curiosa demais, ansiosa demais, eu é que não sei descansar. Se essa relação não der certo meu caro I Phone e eu voltar pro meu antigo tijolinho, pode ter certeza, não é você, sou eu. Você é bom demais pra mim.

quarta-feira, 11 de maio de 2011

Verborragia

Alberto nasceu em uma casa só de mulheres. Por algum mistério da genética os poucos homens da família sempre acabavam morrendo cedo. Com o pai foi assim: não teve quase tempo de aproveitar a chegada do único filho homem, depois de tantas tentativas desesperadas por um varão e sete filhas mulheres.

O pequeno Alberto cresceu rodeado por saiotes: tias, primas, irmãs e vizinhas. Um falatório danado, conversas sobre os folhetins da semana, fofocas do bairro e obviamente muita, mas muita tpm. Durante um bom tempo achavam que ele era mudo, mas faltava simplesmente ao menino a oportunidade de se expressar diante de todo mulherio.

Na adolescência Alberto tentava se soltar no meio de alguma conversa:
- Eu acho que...e logo era interrompido pela tia, pela mãe ou qualquer representante do sexo oposto. Quando finalmente se viu livre e foi para faculdade, Alberto, que agora era só Beto, se apaixonou por uma garota linda, mas uma verdadeira metralhadora verborrágica: as frases ia se emendando, sem que ele achasse uma só brecha para entrar: eu acho que, eu fui, sabe que, outro dia...o coitado só abria a boca se fosse para respirar. Mas ela era tão bonita e um cara como ele nunca iria arrumar outra garota como aquela.

Casaram, tiveram três filhas como predominava a genética dele . E pior: tagarelas igual à mãe. Pobre Alberto, não tinha voz nem mesmo na hora de pedir o sal na mesa. A frase acaba sempre no me pass...

Claro que as meninas pediam a opinião do pai para muita coisa, mas antes que ele pudesse dizer sim ou não, lá vinha a mulher dele, cheia de opiniões. A única solução que Alberto encontrou foi se soltar no trabalho:

- Sabe que eu sou corintiano, mas sempre tive uma simpatia pelo Santos. Uma vez fui pra Santos em 85, achei a cidade tão linda, você conhece? Uma das coisas que eu mais gosto de fazer é viajar. Queria muito ir pro Himalaia, vi um documentário maravilhoso sobre os Sherpas, já ouviu falar neles? É um povo muito interessante, com uma cultura particular. Tenho fascínio também pelos budistas, estou até querendo planejar uma viagem, mas a minha mulher quer ir para Nova Iorque. E as mulheres sempre acabam decidindo. Ao não ser quando elas querem que você decida, porque não querem assumir a responsabilidade, daí meu amigo, é problema, porque depois elas...

E assim segue a conversa por no mínimo 30 minutos ininterruptos, numa explosão de felicidade. O paciente ouve sem poder dar nem um piu, com a boca repleta de algodão, enquanto Alberto continua falando feliz e contente e vai fazendo a obturação na boca do fulano.

terça-feira, 5 de abril de 2011

Big bang



Se eu explodisse em mil pedaços sairiam de mim bolas de borracha deformadas pela dor quente no peito, metros e mais metros de linha que costura as feridas, pedacinhos de um gelo que ficou grudado no estômago. Sairiam pregos fincados no coração, um pouco de areia que secou a garganta e ópera, muita ópera. Seria uma explosão enorme e bonita, com barulho forte e rápido. Ficariam depois dela apenas os sonhos, intactos, sem nem um risco sequer.

quarta-feira, 23 de março de 2011

Cortei meu coração em pedaços e guardei num tuperware dentro da geladeira, ao lado do requeijão. Não no freezer, ainda não.

quarta-feira, 16 de março de 2011

Duas visões de mundo

Eu entro no hospital para visitar alguém da família e ao ver aquele lugar, cheio de camas vazias, penso em almas penadas vagando pelos corredores. Já a minha avózinha de 85 anos, chega para fazer a mesma visita e toda arrumadinha, com seu colar de pérolas e as bochechas coradinhas pelo rouge, olha para um médico de jaleco e me diz suspirando baixinho: deve ter tanto rrrrrrromance por aqui, né? Médicos que se apaixonam pelas enfermeiras, já pensou, quantas histórias de amor?

É, ela vê o copo meio cheio.

segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Shhh, não fala nada.

Uma vez estava esperando o ônibus em uma rodoviária do litoral. Minha pele ardia, o vãozinho do meu dedão estava assado pelas havaianas, o calor era insuportável. Perto de mim haviam mães com crianças de colo, senhorinhas sentadas em cima da mala e dois adolescentes cujas bocas estavam grudadas há mais ou menos quarenta minutos (cheguei a cogitar se eles não estavam precisando de ajuda, presos pelos aparelhos fixos). O busão estava 3, repito, TRÊS horas atrasado. E quando o motorista chegou, minha raiva só fez aumentar. As pessoas aplaudiam o motorista e gritavam felizes: Graças a Deus, é uma bênção! O normal nessas horas seria eu ter reclamado, mas confesso que naquele dia fiquei desanimada. De onde vem essa nossa resignação? Por que achamos que reclamar é ser ranzinza, chato, estraga prazeres? Na agência onde eu trabalho, um elemento rouba quase toda semana a marmita alheia. E pra piorar, o gatuno pega sempre as melhores partes da quentinha: a batatinha frita, o arroz e o feijão. O xuxu, a beterraba, ele faz a gentileza de deixar pro dono. O que me deixa mais triste é que os próprios donos das marmitas nunca se manifestaram, nunca reclamaram e continuaram até ontem almoçando o que sobrava. Mais uma vez me indignei e hoje em nome dos companheiros, mandei um e-mail para as autoridades. No caso aqui, a mocinha do RH. Já reclamei, já fiz tocaia, pensei até em colocar veneno de rato e ver quem cai morto no meio da tarde. Espero que esse elemento no mínimo morra de prisão de ventre. Mas por que não reclamamos das coisas? Não sou historiadora, não sei se são as nossas origens, a nossa colonização ou se essa resposta é velha e o buraco do asfalto é mais embaixo. Só queria que a gente um dia fosse diferente. Vi um comercial na tevê onde o proprietário de um carrão dizia: é ótimo, passa na enchente que é uma beleza. Fiquei chocada, como uma marca se aproveita de uma coisa tão grave como as enchentes para vender caranga? Por que a gente não reclama dos buracos ao invés de pulá-los com a picape? Não quero parecer azeda, mas como melhorar sendo só legal, simpático, carnavalesco e boa praça? Foi assim, sendo bacanão que um belo dia um carinha com gel no cabelo confiscou as economias do país inteiro. Demorou pra gente responder e quando foi pra rua, o dinheiro já tinha ido pra Suíça. As coisas têm mudado, não se pode generalizar, mas ainda temos muito o que reclamar, pedir, reivindicar. Me chame de ranzinza, reclamona, mas eu não me acostumo. De agora em diante, pelo menos na minha marmita, só vai dar jiló.