sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Chove


Estava parada no farol, debaixo de um viaduto. Gotas de chuva escorriam pela beira da construção e pingavam no vidro do carro. O entorno era cinza escuro. Era uma noite de quinta-feira e a cidade tinha as suas infelicidades camufladas. Tão escondidas, que a sombra de um capuz preto passou por trás do carro sem ela nem perceber. Estava sozinha, ouvia música na rádio. Sorrateiramente a sombra deslizou e se transformou em um homem parado na janela do passageiro. Ao olhar para o lado, sua barriga gelou e a garganta ficou seca. Um fantasma magro de olhos profundos. Sem pestanejar veio o golpe brutal que quebrou o vidro da janela. Um barulho forte e seco como a própria pancada. O vidro estilhaçado caía aos poucos, enquanto ele sem pensar no próprio braço tentava agarrar a bolsa em cima do banco. Ela assutada gritou de dentro do carro, mas os gritos foram abafados. Ninguém ouviu. Niguém ao redor se mexeu. Apenas ele. Por um momento se olharam nos olhos. Deviam ter a mesma idade. Assustado com o grito ele fugiu correndo, deixou a bolsa e partiu segurando o braço ensanguentado. Desapareceu no escuro. Ela ficou sozinha. Sentia o peito estilhaçado junto com o vidro. Não sentia raiva, nem revolta, apenas tristeza. Por que aquilo foi acontecer? De quem era a culpa nessa história? Era dela, que tinha deixado a bolsa em cima do banco? Era dele? Da desigualdade social? Da sociedade? Dos políticos? Do capitalismo? Da fome? Do desemprego? Da luta pela sobrevivência? Do darwinismo social? De quem? De quem? Tudo isso no tempo de um farol. Abriu, ficou verde, saiu andando, engatou a marcha enquanto secava as lágrimas. Queria que essa história fosse mera ficção, mas não era.

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Luz de natal

Chega o natal e com ele as varandas iluminadas com luzinhas de todas as cores e tipos de piscagens são compradas com maior orgulho na 25 de março. Pois caro leitor, aqui vai o meu conselho da semana: antes de tunar a sua varanda, pare e pergunte se a sua decoração de natal não está deixando a sua casa com cara motelzinho de Mongaguá. Daqueles com luz neon e vermelha, manja? Porque a mim, a única coisa que essas varandas inspiram é o suicídio. Não que eu não goste de decoração de natal, mas tem coisa que é too much. E digo mais a vocês caros vizinhos, a sua cafonice ainda por cima é anti ecológica. Como é que ninguém ainda tocou na questão do consumo de energia? Será que o natal é tão sagrado, que pode fuder com o planeta enquanto eu tenho que fechar a pia para escovar os dentes? Como ninguém ainda falou no quanto essa cafonice natalina aumenta o consumo de energia? Todos os dias vejo matérias dizendo como as previsões de aquecimento global são na verdade piores do que as piores das previsões. Então por que na época do natal todo mundo se esquece disso? Se você meu amigo, quer ter luzinhas na sua varanda, dê um jeito de tornar a sua iluminação mais ecológica: coloque seu porteiro para pedalar e gerar energia, sei la, vire-se. Mas faça alguma coisa para que eu, você e todo mundo possamos ter os próximos natais também. E pra vc aí, que está me achando alarmista demais, sabe o que eu digo? Glub, glub, glub.

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Cisca

A história destes dois é uma história curiosa.

Não é invenção de verso, nem de prosa.

Eu juro que é real, aconteceu perto da roseira, ali no meu quintal.

Conta Francisca foi amor `a primeira vista.

Não foi o destino, nem um amigo que deu o grande empurrão.

O cupido desta história chama brisa de verão.

Quando pela primeira vez viu a menina, Cisco se sentiu flutuando: perdeu o controle das pernas e foi parar nos olhos dela voando.

Olhão verde, arregalado. Pronto, lá estava ele todo apaixonado.

Naquele momento, Francisca não conseguiu segurar: uma lágrima escorreu pelo rosto, desceu pelo pescoço até bater no seu colar.

O fato impressionante, é que Cisco fez a garota derramar uma gota gigante.

Mas não se engane pensando que esta história se termina com tristeza.

Se a menina chorava, era de felicidade. Finalmente tinha encontrado um amor assim de verdade.
Escrever para nao morrer de raiva.

Do caralho, da puta que o pariu, do transito.

escrever para nao morrer de amor.

e pouco a pouco ir juntando as palavras tao solitarias e abandonadas pelo vocabulario popular.

Escrever para nao morrer de tedio nas linhas retas do texto.

Para nao morrer de tristeza com Z, que deixou o S para fora da palavra choramingando.

Escrever para nao morrer de decepçao, frustraçao, todas as palavras com um começo diferente e o mesmo fim. Escrever para nao viver de pontos, colocar vrigulas, pausas, acentos.

Escrever que é para viver feliz.

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Todas as mulheres do mundo

Tem dias que eu acordo querendo ser Joana D´Arc. Vestir minha armadura de ferro para enfrentar os meus demônios. Ter a força de lutar pelo que eu acredito, nem que o final da minha história seja na fogueira. Em outros queria ser Agatha Christie e inventar pra minha vida grandes mistérios em viagens pelo Orient Express. Ou talvez como Clarice Lispector, responder com páginas cínicas aos tapas que a vida às vezes distribui. Quem sabe até me embriagar e cantar as amarguras dos meus amores com a voz rouca da Billie Holiday. Ser Frida Kahlo e assumir todas as minhas diferenças, pintar numa tela as minhas entranhas. Me transformar na musa de Serge Gainsbourg, prazer, Jane Birkin. Atirar brioches pela janela e ser lembrada como Maria Antonieta, a mulher mais fútil da história. Tem dias para tudo, até para ficar feliz de ser apenas eu.

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Lista

Como estamos nos aproximando da virada do ano, resolvi fazer uma lista coisas que eu sempre quis fazer:

- entrar num táxi e dizer: motorista, siga aquele carro ( e como nos filmes sair sem nunca pagar)
- pintar o cabelo de ruiva
- jogar um copo de vinho na cara de alguém
- comprar uma moto
- beijar a Natalie Portman
- prever o futuro
- dizer em alto e bom tom: eu me demito
- viajar para Índia
- ganhar o oscar
- o prêmio Nobel também não seria nada mal
- cair numa piscina de gelatina
- e obviamente nunca, nunca parar de sonhar